Animais Peçonhentos
O que são animais peçonhentos?
Animais peçonhentos são aqueles que possuem glândulas especializadas na produção de substâncias tóxicas, denominadas peçonhas, e que contam com um aparato anatômico capaz de injetá-las ativamente em outros organismos, geralmente como forma de defesa ou para captura de presas. Essa peçonha pode ter efeitos variados, como neurotóxicos, citotóxicos, hemotóxicos ou miotóxicos, e sua ação depende tanto da composição química quanto da quantidade inoculada.
É fundamental diferenciar animais peçonhentos de animais venenosos: os primeiros injetam ativamente a substância, enquanto os segundos liberam toxinas por contato, ingestão ou atrito, sem um aparato especializado de inoculação.
Características dos animais peçonhentos:
• Glândulas de produção de toxinas: os animais peçonhentos apresentam glândulas adaptadas à produção de substâncias tóxicas com composição bioquímica complexa, capaz de afetar diferentes tecidos e sistemas dos organismos atingidos.
• Estrutura de inoculação: esses animais possuem estruturas anatômicas específicas para a introdução da peçonha, como presas (em serpentes), ferrões (em escorpiões e abelhas) ou quelíceras (em aranhas).
• Função ecológica da peçonha: a substância tóxica pode ser utilizada para paralisar presas, iniciar a digestão extracorpórea, evitar predações ou disputar território, sendo uma ferramenta adaptativa relevante.
• Diversidade de toxinas: as peçonhas podem conter enzimas, proteínas, peptídeos e outros compostos com diferentes alvos fisiológicos, como o sistema nervoso, circulatório ou muscular.
• Ação específica e seletiva: algumas peçonhas têm ação muito específica, sendo perigosas apenas para determinados grupos de animais ou humanos, enquanto outras são de amplo espectro.
Exemplos de animais peçonhentos:
• Serpente jararaca (Bothrops jararaca): comum no Brasil, essa serpente possui presas retráteis que injetam uma peçonha hemotóxica, provocando hemorragias, necroses e inflamações locais. A jararaca é responsável por grande parte dos acidentes ofídicos no país.
• Escorpião-amarelo (Tityus serrulatus): presente em áreas urbanas, sua peçonha neurotóxica pode provocar dores intensas, vômitos, sudorese e, em casos graves, alterações cardíacas e respiratórias, sendo especialmente perigosa para crianças.
• Aranha-armadeira (Phoneutria nigriventer): conhecida por seu comportamento agressivo, possui uma peçonha neurotóxica potente, que pode causar dor intensa, taquicardia, sudorese e, em casos graves, convulsões.
• Arraia-de-água-doce (Potamotrygon spp.): possui um ferrão na cauda revestido por tecido glandular que libera toxinas. O ferimento costuma causar dor extrema, necrose e infecções secundárias.
• Abelha africanizada (Apis mellifera scutellata): injeta toxinas por meio do ferrão, sendo capaz de provocar reações alérgicas severas e até choque anafilático em indivíduos sensíveis, especialmente quando em enxames.
• Lacraia (Scolopendra spp.): animal de corpo segmentado e achatado, a lacraia pertence ao grupo dos quilópodes e é equipada com um par de forcípulas, estruturas semelhantes a garras localizadas logo atrás da cabeça, que servem para inocular sua peçonha em presas ou em situações de defesa. Sua toxina possui efeito neurotóxico e citotóxico, provocando dor aguda, edema, vermelhidão e, em alguns casos, necrose local. A lacraia é um predador ativo, alimentando-se de insetos, minhocas e até pequenos vertebrados. Embora raramente cause complicações graves em humanos, sua picada exige atenção médica, sobretudo em casos de reação alérgica. É comum em ambientes úmidos, como jardins, banheiros e entulhos.
• Vespa (família Vespidae): as vespas são insetos alados peçonhentos que utilizam um ferrão conectado a uma glândula de veneno para se defender. A peçonha das vespas contém substâncias neurotóxicas e alérgicas, podendo causar dor intensa, inflamação, coceira, inchaço e, em casos mais graves, reações anafiláticas. Diferentemente das abelhas, as vespas conseguem ferroar várias vezes, pois não perdem o ferrão ao picar. Estão presentes em áreas urbanas e rurais, e algumas espécies são bastante agressivas quando perturbadas. A gravidade do acidente depende da quantidade de ferroadas e da sensibilidade do indivíduo ao veneno.
• Taturana (larvas de mariposas da família Megalopygidae e Saturniidae): a taturana é uma lagarta com cerdas urticantes ligadas a glândulas de veneno que são liberadas por contato direto com a pele. Algumas espécies, como a Lonomia obliqua, encontrada no sul do Brasil, produzem toxinas extremamente perigosas, com ação anticoagulante, podendo causar hemorragias internas e até levar à morte. O contato com as cerdas provoca queimação, dor intensa, edemas, vermelhidão e, em casos severos, complicações sistêmicas. O tratamento rápido é essencial, e, para as espécies mais perigosas, existe soro específico. Essas lagartas são geralmente encontradas em troncos e folhas de árvores.
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Escorpião-amarelo: exemplo de aracnídeo peçonhento |
Importância médica dos animais peçonhentos
Os animais peçonhentos representam um desafio relevante para a saúde pública, especialmente em regiões tropicais. Acidentes ofídicos, escorpionismos e araneísmos são responsáveis por milhares de atendimentos médicos anuais no Brasil, com potencial de evoluírem para quadros graves ou fatais se não tratados adequadamente. O desenvolvimento de soros antiofídicos e outros antídotos depende do estudo da composição bioquímica das peçonhas, o que reforça a importância do conhecimento e monitoramento dessas espécies.
Uso biotecnológico das peçonhas
Diversas pesquisas vêm utilizando componentes das peçonhas de animais peçonhentos para fins medicinais. Por exemplo, derivados da peçonha da jararaca foram fundamentais para a criação de medicamentos anti-hipertensivos, como os inibidores da enzima conversora da angiotensina (IECA). Toxinas de escorpiões e aranhas têm sido estudadas como possíveis tratamentos contra epilepsia, dores crônicas e até alguns tipos de câncer. Isso mostra o potencial biotecnológico dessas substâncias quando estudadas em ambiente controlado e com finalidade terapêutica.
Ações preventivas e educação ambiental
A redução de acidentes com animais peçonhentos passa pelo conhecimento das espécies locais, adoção de medidas preventivas e educação ambiental. Manter terrenos limpos, utilizar calçados adequados em áreas de risco, evitar manuseio direto de animais silvestres e procurar assistência médica imediata em casos de picadas são atitudes fundamentais. Além disso, campanhas educativas podem conscientizar a população sobre a importância ecológica desses animais, evitando sua destruição indiscriminada.
Por Tânia Cabral - Professora de Biologia e Ciências - graduada na Unesp, 2001.
Publicado em 01/09/2025
Temas relacionados
Bibliografia Indicada
BARNES, R. D. Zoologia Geral. 6 ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 1988.
Acidentes por animais peçonhentos (Ministério da Saúde)
Guia de Animais Peçonhentos do Brasil